LIXO ATÔMICO DE ITU
(HISTÓRICO EM TEXTO PUBLICADO NA PÁGINA CENTRAL, DA EDIÇÃO 82 DO URTIGA, DE MAIO/1994)
Por 2 vezes o monitoramento da Cetesb descobriu contaminação radioativa no poço do caseiro do Depósito de Lixo Atômico, que fica no Bairro Botuxim em Itu. Este fato motiva o estudo de ação pela Curadoria do Meio Ambiente, em conjunto com a Aipa, pedindo segurança para a população.
O QUE
A responsável pelo depósito de material radioativo no Sitio São Bento, bairro Botuxim, em Itu é a Nuclemon, subsidiaria da Nuclebrás, criada com finalidade especifica de pesquisar, lavrar, industrializar e comercializar as areias pesadas do nosso país.
Como única responsável pela produção de compostos de Tório no Brasil, a Nuclemon tem usinas instaladas no litoral do Rio de Janeiro e Espírito Santo, onde minerais já separados, classificados como ilemita, rutilio, zirconita e monazita são processados, obtendo-se produtos para fins industriais, além de urânio e tório.
Na fase de processamento obtém-se um subproduto, denominado Torta II, que contem 20% de Tório e 1% de urânio, elementos que podem ser posteriormente extraídos pelo reprocessamento deste subproduto.
Essa Torta II é o material depositado em Itu, que conhecemos como "lixo atômico". O mencionado depósito situa-se a montante do córrego Monjolinho, um dos mananciais da cidade. São cerca de 3500 toneladas de material que merecem cuidados especiais, infelizmente não observados.
HISTÓRICO
A Torta II começou a ser depositada em Itu por volta de 1975, sem as mais rudimentares medidas de segurança. Construído por empreiteiros do município, que ignoravam a finalidade da obra no Sitio comprado pela Nuclemon, o depósito não tinha cerca de proteção, cobertura, sinalização, etc.
O problema foi detectado em 1979 pelo então vereador Amauri Christofoletti, que iniciara investigações sobre movimentação no referido sítio, a partir de denúncia de uma professora. As medidas tomadas na época, com prefeitura comandada por Olavo Volpato, não conseguiram eliminar o problema.
Em 1983, já no governo Piunti, em reunião do Conselho do Povo, criou-se comissão em Itu, que contatou autoridades para tentar resolver o problema. A Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear), que por lei cuida do setor no País, prometeu fazer monitoramento. Mas, até 1985, não entregou os resultados ao Município. A cidade organizou então grande manifestação.
Resultado do protesto, em 1986, formou-se comissão interministerial, com representantes de 2 Ministérios, do Governo Estadual, Municipal e 3 cientistas. A perícia constatou irregularidades, inclusive na construção dos silos que guardam a Torta II. A Comissão recomendou que os depósitos fossem reavaliados, al ‚ m de pedir implantação de laboratório para controle de qualidade local, treinamento do pessoal da Prefeitura, etc...
A Cetesb passou a monitorar radioatividade dos mananciais em Itu. Em 1990, a então Presidente do Comdema (Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente), Beatriz Pionti, divulgou primeira noticia de contaminação no poço do caseiro, no sitio São Bento, a 150 metros de distância do depósito. E mandou oficio ao Cnen, exigindo imediatas providências.
Com base na denúncia, a Associação Ituana de Proteção Ambiental, junto com Câmara Municipal de Itu, entrou com pedido de inquérito civil na Curadoria do Meio Ambiente, exigindo o fim das causas da contaminação. Várias promessas se seguiram, dos órgãos governamentais, de possível retirada do material para Poços de Caldas, o que levou a postergar a ação.
Nada aconteceu. Pior: a Cetesb aumentou intervalos de monitoramento, exceto no poço do caseiro em Botuxim. Mais recentemente, nova contaminação foi detectada no local, motivando novos trabalhos pela Curadoria do Meio Ambiente, que - junto com a Aipa - estuda como exigir providencias para garantir segurança da população e do ambiente em geral.
--
(texto produzido pela Aipa, a partir de relatório de Carlos Mazzuco,
publicado pelo jornal Urtiga em 1991, e informações posteriores, do mesmo jornal.
Com base nele, foi elaborado material para as Escolas Padrão de Itu,
usado no mês de atividades antinucleares).
"OS EFEITOS DE CHERNOBYL"
NOTA NO EDITORIAL DO URTIGA, DA EDIÇÃO 96, DE JULHO/1995, SOBRE ENCERRAMENTO DA AÇÃO PÚBLICA:
Em tempo: A ação que a Curadoria do Meio Ambiente de Itu movia contra os responsáveis pelo depósito de lixo atômico, neste município, foi arquivada. Ela foi iniciada em conjunto com a Aipa, ou Associação Ituana de Proteção Ambiental, depois que se constatou - por duas vezes - vazamento radioativo no poço do caseiro do sítio do depósito.
Depois de arrolar um enorme volume de documentos, o Curador do Meio Ambiente de Itu, Alberto Camiña entendeu que não havia provas suficientes para prosseguir com o processo. O que está armazenado no depósito ituano é Torta II, que contém 20% de Tório e 1% de urânio.
Nos anos 70, ele foi disposto a céu aberto, sem nenhuma consulta à população, no sítio São Bento, que fica no bairro Botuxim, na área rural de Itu. Foi a partir da denúncia de uma professora, que morava perto do sítio, que se descobriu, em 1979, que o material era radioativo. Desde então, multiplicaram-se protestos contra a permanência da Torta II no bairro Botuxim. Inclusive um, no ano passado, onde estudantes ituanos expuseram desenhos por um dia, dentro do Congresso Nacional em Brasília, e a Aipa participou de reunião técnica sobre a questão nuclear. Agora, é esperar para ver o que ocorre.
"O CIGARRO E O LIXO ATÔMICO"
EDITORIAL DO URTIGA, NA EDIÇÃO DE AGOSTO/1992, ONDE REPRESENTANTE DA CNEN, COMENTA O PROBLEMA
Faltavam poucos dias para a Eco 92. Como parte do RioCiência 92 - evento científico organizado na Universidade Federal do Rio de Janeiro - o físico Anselmo Paschoa, da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen), tinha a incômoda missão de falar sobre a segurança das instalações nucleares brasileiras.
Para defender o polêmico ponto de vista de que o pânico da operação de retirada da população ante o acidente nuclear em Angra dos Reis causaria mais danos de que a permanência das pessoas no local, ele se apoiou num fato então ainda não divulgado. Como condenar o perigo da contaminação nuclear em eventuais acidentes, se cada indivíduo que fuma ingere, voluntariamente, doses de radioatividade através dos cigarros? comparou.
Em fins de julho, quase 2 meses depois, resultados de estudo realizado no Instituto de Física da Universidade de São Paulo ganharam espaço na grande imprensa. A notícia - rapidamente rebatida pela indústria do setor - dava conta que quem fuma um maço por dia de determinadas marcas, está sujeito à exposição radioativa de até 2 chapas de pulmão diárias. Este índice seria 11 vezes maior de que a contaminação m ‚ dia por urânio dos cigarros norte-americanos. Ou seja, haveria para consumidores brasileiros risco 11 vezes maior de contrair câncer do pulmão, de bexiga ou arteriosclerose precoce, de que para fumantes da América do Norte.
Falando a Urtiga, Anselmo Paschoa contou que participou das primeiras pesquisas neste campo. Mas considerou precipitada a conclusão de que urânio dos cigarros, isoladamente, levaria a tantas moléstias: "Não está provado que o corpo humano absorva dose significativa de urânio via inalação".
O polônio - outro elemento radioativo existente nos cigarros - sim. Mas, mesmo com estudos americanos evidenciando a potencialidade cancerígena do polônio, não se pode garantir que seja ele o responsável pelas doenças. Tabaco tem outros componentes, como alcatrão. Com certeza, o "mix"é prejudicial. O que sabemos é que fumar dá câncer."
O representante da Cnen ouviu que os candidatos à prefeitura de Itu classificam o depósito de "lixo atômico" entre os maiores problemas ambientais locais (leia, nas páginas centrais*). "Se este for o problema, o município está ótimo", comentou, bem humorado. Membro da comissão que há cerca de 6 anos pesquisou possível contaminação da área, ele admite que após descoberta do depósito e construção das caixas de concreto onde o material foi inserido (início dos anos 80) houve erro técnico, que resultou em furo numa delas. Isto implicou no vazamento radioativo, atingindo poço do caseiro vizinho ao depósito, o que - quando divulgado - gerou processo da Curadoria do Meio Ambiente, até hoje sem resultado. "O furo foi fechado", assegura.
Relembrando que o que há em Botuxim é Torta II, reaproveitável, o cientista prometeu: "A curto prazo estará tudo resolvido. Iremos retirar tudo, para reprocessamento. Já estamos em fase de licenciamento para construção de barragem (dos rejeitos pós-reaproveitamento) e de estudos de viabilidade econômica do projeto, a ser desenvolvido por uma empresa."
Anselmo Paschoa encerrou a entrevista a Urtiga com um pedido: gostaria de voltar a Itu para - num debate suprapartidário - responder sobre o depósito de "lixo" atômico, segurança em Aramar, Angra dos Reis e outros temas que preocupam a população.
Veja matéria no AIPA: